Atacante ganês do Fortaleza conta início desafiador e sonho de inspirar gerações
Michael Quarcoo contou ao O POVO acerca da captação para viajar ao Brasil e seu desejo de virar um modelo para gerações futuras do futebol africanoDesde o início dos anos 60, quando o Gana conquistou sua independência, o futebol é trabalhado no país como uma ferramenta de afirmação da identidade nacional. Dentre as histórias originadas no esporte praticado entre as ruas, escolas e campos da cidade de Agona Swedru, uma trilhou seu caminho ao Brasil, chegando na capital cearense, mais precisamente em Maracanaú, no CT Ribamar Bezerra, onde hoje reside vestindo vermelho-azul-e-branco.
Atacante na base do Fortaleza, Michael Quarcoo contou ao O POVO o seu início desafiador no futebol, a captação para viajar ao Brasil e seu sonho de virar um modelo para gerações futuras do futebol africano. Além disso, demonstrou a transparência de seus sonhos, inspirações e a saudade dos familiares que permaneceram em Gana.
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O atleta de 19 anos tem sido utilizado como ponta pelo lado esquerdo em seu bom início na categoria sub-20 do Tricolor.
Depois de se destacar em uma competição na cidade onde vivia com a família, quando passava por um momento em que carregava a dúvida se o próprio objetivo seria possível, Quarcoo foi selecionado em seu país por olheiros do Capital-DF, se destacou na Copa São Paulo de Futebol Jr. com seis gols em cinco jogos – jogando como lateral – e chamou a atenção do Leão do Pici.
Inspirações, aspirações, viagem e saudades
Quarcoo viveu a oportunidade única de viajar ao Brasil e tentar a sorte no futebol profissional, mas não esquece do princípio, ainda em Gana. O jogador, além dos ensinamentos, carrega a saudade de sua família e o sonho de dar a eles um futuro melhor. Além disso, visa inspirar uma nova geração do futebol ganês, fazer sucesso e levar perspectivas diferentes à sua cidade natal.
"Comecei a jogar futebol muito jovem, por volta dos 5 ou 6 anos, na minha cidade natal [Agona Swedru], em Gana. Eu jogava nas ruas e na escola com meus amigos. A paixão pelo jogo cresceu à medida que eu envelhecia, e aos 12 anos eu já sabia que queria seguir carreira profissional. Era meu sonho me tornar um jogador de futebol profissional e representar meu país", conta o jovem atacante.
O jogador deixou em Gana a mãe, a avó e a irmã para se juntar ao elenco sub-20 do Capital-DF. Nos primeiros momentos, entretanto, a família de Quarcoo não queria que ele se tornasse jogador de futebol, mas mudou de opinião.
De origem humilde, o atleta chegou a trabalhar como comerciante auxiliando a sua avó em Gana, e contou que, com o apoio dela, mostrou aos seus pais todo o esforço que fazia para trabalhar e jogar. Hoje, Quarcoo se comunica com a família pela internet, por meio de vídeochamadas. Contudo, quando chegou ao Brasil, os parentes não tinham um dispositivo que possibilitasse a ação. Por isso, pedia para um amigo levar o celular até eles para atualizar a mãe sobre sua rotina.
“Toda a minha família mora em Gana, então eu vim de Gana para a capital (Brasília) para jogar e acabei assinando como profissional [ainda no Capital]. A saudade da minha família é imensa, mas mantenho contato regular por videochamadas e mensagens. Também foco nos meus objetivos, lembrando que estou aqui para criar um futuro melhor para todos nós. Isso ajuda a amenizar a saudade e a manter a conexão com eles, mesmo à distância”, explicou.
Para o futuro, o sonho de ser reconhecido e se tornar inspiração: "Nos próximos cinco anos, me vejo jogando no mais alto nível possível. Meu sonho é me tornar um dos melhores jogadores do mundo, representar minha seleção nacional nos maiores palcos e inspirar a próxima geração de jogadores de futebol em Gana e além. Aspiro ganhar títulos importantes, tanto a nível de clube quanto internacional, e deixar um legado no esporte", finalizou.
Sonho de criança, dúvidas e distância até a oportunidade
Com apenas 12 anos de idade, quando tentava replicar as jogadas de seus ídolos Didier Drogba e Michael Essien, na escola, Quarcoo tinha convicção de que queria seguir uma carreira no esporte. No entanto, o caminho até o Brasil foi marcado por desafios e até mesmo dúvidas sobre o próprio futuro.
"As principais dificuldades no início eram os recursos em falta e as oportunidades também. Em Gana, não tínhamos as melhores instalações ou equipamentos de treinamento. Era desafiador ser notado por olheiros e times. Houve momentos em que duvidei se teria alguma chance de jogar profissionalmente, mas continuei trabalhando duro e mantendo o foco nos meus objetivos", detalhou.
Sobre seus ídolos, Quarcoo conta: "Minhas maiores inspirações no futebol são Didier Drogba e Michael Essien. Ambos são lendas que tiveram carreiras incríveis e fizeram muito para colocar o futebol africano no mapa global. A dedicação, habilidade e qualidades de liderança deles são coisas que me esforço para fazer na minha própria carreira".
Após se destacar em torneios locais, ele chamou a atenção de olheiros do Capital-DF, um jovem clube brasileiro fundado em 2005 em uma região administrativa do Distrito Federal. O time é um clube empresa que tem realizado investimentos altos, em especial na captação para a base, gerido no modelo de SAF, e tem Paulinho Kobayashi – hoje emprestado ao Ferroviário – como treinador do time principal, que chegou a relacionar Quarcoo no profissional.
"Minha jornada foi bastante desafiadora, mas recompensadora. Joguei por vários clubes locais em Gana e participei de diversos torneios juvenis. Meu desempenho nesses torneios chamou a atenção de olheiros do Capital-DF, no Brasil. O processo de recrutamento envolveu uma série de testes e avaliações, e tive a sorte de impressioná-los com minhas habilidades e determinação. Mudar para o Brasil foi um grande passo, mas era uma oportunidade que eu não podia deixar passar", contou.
Destaque na Copinha, transição para o ataque e adaptação no Fortaleza
Na Copa São Paulo de Futebol Júnior, Quarcoo foi um dos grandes destaques da fase de grupos. Jogando em uma posição defensiva, como lateral esquerdo, o ganês marcou seis gols em cinco jogos, chegando a ser o maior artilheiro estrangeiro da história da competição – ultrapassado pelo boliviano Enzo, do Santos, na mesma edição.
"Foi uma sensação incrível me destacar na Copinha. Marcar 6 gols em 5 jogos foi um grande impulso de confiança para mim. Mesmo que eu ainda não estivesse jogando como atacante, sempre tentava participar do ataque e aproveitar minhas chances. A Copinha foi ótima para mostrar meu talento e teve um papel significativo na minha carreira", disse.
Ao ser contratado pelo Fortaleza, a comissão técnica percebeu sua velocidade e habilidade, pensando assim em colocá-lo para o setor ofensivo. Com isso, Quarcoo tem atuado como ponta pelo lado esquerdo.
"A transição de lateral para atacante foi bastante interessante. Começou durante as sessões de treinamento, quando meu técnico percebeu minha velocidade, drible e capacidade de marcar gols. Ele sugeriu que eu tentasse jogar como atacante, e descobri que gostava da posição. A motivação por trás da mudança foi utilizar minha força de forma mais eficaz", explicou.
Como principal diferença no Brasil, o atacante destaca o clima, mas se diz encantando com a torcida que encontrou na capital cearense. Quanto ao idioma, Quarcoo conta que tem recebido o apoio de Léo Porto, atual técnico do sub-20 e auxiliar técnico fixo do Fortaleza.
"Adaptar-se a Fortaleza tem sido uma experiência única. A cidade é vibrante e os torcedores são incrivelmente apaixonados. Uma das principais diferenças que notei é o clima; aqui é muito mais quente comparado a Gana. A cultura também é muito diferente, com uma forte ênfase na música, dança e reuniões familiares. Quanto ao idioma, tenho me esforçado para aprender português. É desafiador, mas meus colegas de equipe e a comissão técnica têm sido muito solidários, ajudando-me a melhorar a cada dia", contou.
“Essa barreira linguística, às vezes, torna as coisas difíceis, mas estou começando a me adaptar também. Estou empenhado em aprender. Além disso, o técnico do sub-20, Léo [Porto], tem sido muito prestativo ao me ajudar na questão do idioma, o que tem facilitado bastante minha integração no clube”, completou.
Sobre as diferenças entre o futebol ganês e o brasileiro, Quarcoo detalhou: "As principais diferenças que notei entre o futebol brasileiro e o ganês são os estilos de jogo e o ritmo da partida. O futebol brasileiro tende a ser mais técnico e habilidoso. O futebol ganês é mais físico e direto. Adaptar-se a esse novo estilo tem sido uma experiência de aprendizado, mas estou abraçando-a”, finalizou.