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Como minimizar os impactos negativos da retomada econômica no meio ambiente

Consumo desenfreado e desequilíbrio entre setores econômicos e meio ambiente preocupam especialistas
14:58 | Jul. 21, 2020
Autor Rubens Rodrigues
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Rubens Rodrigues Repórter do OPOVO
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Tipo Notícia

Quatro meses após o início do isolamento social no Ceará, as ruas voltam a ser tomadas de gente e toda movimentação que a retomada da economia traz com ela. Mesmo aplicada em etapas, essa reintegração faz com que seja possível perceber a diferença desse antes e depois do lockdown. O meio ambiente, por sua vez, é diretamente impactado.

A partir de ontem, dia 20, atividades ao ar livre e ligadas à natureza foram permitidas, conforma a fase 4 do Plano Responsável das Atividades Econômicas e Comportamentais. Antes, já na fase 3, calçadões e praças também foram liberadas. Mas o que isso significa para a natureza? O POVO ouviu especialistas no assunto.

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Para o professor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), Marcelo Soares, a retomada econômica nos moldes anteriores ao isolamento deve resultar nas mesmas problemáticas que a natureza já enfrentava. A exemplo da geração de resíduos industriais, a poluição atmosférica e dos ambientes aquáticos. "Por um tempo, há uma tendência das pessoas tentarem evitar o transporte público. O uso maior de veículos leva ao aumento de poluentes", destaca.

Marcelo Soares, que também é doutor em Geociências e cientista-chefe de Meio Ambiente pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) e Secretaria do Meio Ambiente (Sema) diz que esses impactos devem ocorrer apenas em um cenário onde não seja normalizada redução ou controle das atividades.

Ele lembra que serão retomadas visitações a áreas verdes, parques, litoral e municípios turísticos, além das atividades comuns dessas regiões. "O Brasil tem muitas áreas bonitas, verdes. No ecoturismo, essa visitação deve ser incentivada, mas não de forma insustentável", alerta.

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"Uma preocupação é a questão de liberação de empreendimentos, de licenciamentos, porque estamos no meio de um problema fiscal grave", continua Marcelo Soares. "Porém, isso não deve servir de justificativa para levantar empreendimentos de qualquer maneira. Não pode haver relaxamento das questões ambientais. Principalmente no Ceará, onde muita gente vive dos recursos naturais".

Ele diz ainda que a pandemia mostrou que há setores em que é possível, por exemplo, trabalhar de casa. "O trabalho remoto pode abrir nichos novos de mercado, o que leva as pessoas a se deslocarem menos na Cidade. Vai haver menos engarrafamento, e há uma ligação da questão atmosférica com uma série de doenças", reflete. "Talvez na retomada a gente vá ter uma questão de turismo mais local, regional. Isso pode ser bom socialmente, economicamente e ambientalmente porque vai reduzir grandes deslocamentos que geram muito impacto. Vejo como uma tendência".

Professora do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da UFC, Marisete Dantas destaca que a "tentativa de equilíbrio" da sociedade com a natureza não foi efetivada, já que o retorno às atividades ocorre poucos meses após o início da pandemia. "O ambiente deu uma respirada. Agora vamos enfrentar grande perda dessa qualidade natural e daqui a alguns meses estaremos como os mesmos problemas de antes", projeta. "A degradação vai ser sentida".

Consumo desenfreado

O ponto de partida para uma sociedade sustentável pós-pandemia é o equilíbrio. A geógrafa Magda Maya, doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente e autora do livro "Sustentabilidade 4.0" aponta que, neste momento, o indicado é não consumir de forma desenfreada. Ter comportamento calmo e controle das ações são aspectos que farão diferença nessa próxima etapa.

"Enquanto as pessoas estão em casa, seria interessante que elas pesquisem produtos e empresas que tenham a pegada da sustentabilidade. O consumo automaticamente resulta no descarte", explica, especificando a geração de resíduos como um dos grandes problemas das grandes cidades. Por isso, é preciso entender até mesmo se o serviço de coleta urbana vai conseguir dar conta da quantidade de lixo gerado.

É possível até ventilar que, pelo menos nesse período, ambientalistas têm perdido a luta contra o consumo crescente do plástico, tão descartável quanto prejudicial à natureza. De acordo com relatório da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), em maio último, foram coletados 28% a mais de resíduos recicláveis em relação ao mesmo período de 2019. Outro estudo da Abrelpe em parceria com a ONU Meio Ambiente mostra que 145 mil toneladas de resíduos são descartados diariamente de forma irregular na América Latina.

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Mudança de hábito

Magda Maya classifica este momento como o mais oportuno para refletir e, quem sabe, mudar hábitos. "A situação de restrição da própria liberdade faz com que a gente tenha que se conformar a viver com menos, com aquilo que é essencial", pondera. Ela diz que é possível pensar nas restrições como um novo modelo em que há menos ansiedade, menos consumo e menos descarte. Menos dependência das coisas materiais e mais dependência de família, lar e do prazer de vivenciar o dia a dia.

"O grande aprendizado agora é as pessoas terem essa visão mais sistemática, mais total (do meio ambiente). Ter mais consciência sobre o planeta terra, saber que as reivindicações dos ambientalistas são importantes porque tudo isso afeta como vivemos", afirma.

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