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'Uzmercáduz' são a nata reacionária
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Reinaldo Azevedo é jornalista político, autor do livro

'Uzmercáduz' são a nata reacionária

Você pertence ao setor de proteína animal porque consome um bife?
Tipo Análise
Fachada da Fiesp na Avenida Paulista (Foto: Kleist BerlinSeguir/Flicker/Domínio Público)
Foto: Kleist BerlinSeguir/Flicker/Domínio Público Fachada da Fiesp na Avenida Paulista

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Pesquisa da Genial-Quaest divulgada na quarta (15) revela mais do que a opinião de 82 executivos do mercado financeiro. Expõe o núcleo do reacionarismo nacional, um pedaço da economia de mercado corroída pelo "mercadismo" burro, a contaminação desses luminares pelo bolsonarismo troglodita, o flerte com um país ética e moralmente degenerado e, adicionalmente, um provável descuido com o dinheiro de terceiros.

Nota: há certo esforço para tornar "Uzmercáduz" um ente metafísico. Nos termos de Gil Vicente, seriam "Todo Mundo" e "Ninguém". Assim, se você tem uns caraminguás depositados, seria mercado também. Conversa mole. A Quaest ouviu 82 pessoas. Acertadamente, não estou na lista. E você? A composição da amostra, ademais, não é a de uma pesquisa eleitoral. O fato de que seríamos todos punidos por um calote da dívida não nos torna parte "d’Uzmercáduz". Não atuo no setor de proteína animal só porque como um bife, embora seja certo que, sem boi, não tem carne.

Antes que se conclua o terceiro mês do governo Lula, 98% dos bravos pensam que a política econômica está errada. Como não são entes etéreos, é provável que concordassem com a de Guedes-Bolsonaro. De que "política econômica" estão a falar agora? Antes que se tenha o novo arcabouço fiscal - o próprio presidente só conhecerá detalhes da proposta nesta sexta (16) -, como ser judicioso a respeito? É só reacionarismo disfarçado de juízo técnico. Quando souberem, vão gostar? Respondo ao fim do texto.

A demonizada PEC da Transição ainda pesa nessa avaliação. Sem ela, teria sido impossível, por exemplo, retomar o Minha Casa Minha Vida no país dos soterrados. Afirmam que a política fiscal não vai gerar sustentabilidade da dívida pública 90% dos exegetas da própria ortodoxia. É só terrorismo influente.

Outro dado encantador: para 68%, o governo não estaria preocupado em combater a inflação, sabe-se lá por quê. Talvez a correta crítica de Lula à Selic alimente essa opinião. Segundo 90%, o BC acertou ao manter a taxa a 13,75%. Dez por cento dizem confiar em Fernando Haddad, ministro da Fazenda; 38% não. Ficam com um "mais ou menos" 52%. Os Belzebus são Gleisi Hoffmann e Aloizio Mercadante, presidentes, respectivamente, do PT e do BNDES. Não confiam neles 98%.

A reserva é até compreensível no caso de Gleisi, sem entrar no mérito de suas opiniões. À frente do principal partido da base, vai para o embate. E no caso de Mercadante? Que decisão tomou ou que declaração fez que afrontaram a responsabilidade fiscal? O índice negativo de Lula, nesse quesito, é de 94% - o de Bolsonaro é menor: 74%. Cuidado! Nada menos de 20% dos que teoricamente velam por sua grana confiam no cara das pistolas & diamantes. Que lama!

Não diminuo a importância dessas pessoas. Existem e podem provocar grandes estragos. Espetaculares 68% apostam no taco de Roberto Campos Neto, presidente do BC. Comanda a instituição que elevou a Selic de 2% para 13,75% em dois anos, indo de uma taxa real negativa de 0,75% para uma positiva em torno de 8% agora. Como canta Angela Ro Ro em "Gota de Sangue", não se deve confundir carinho com desejo. Nem confiança com gratidão.

A mão invisível "duzmercáduz" anda trêmula. Dois bancos americanos e um europeu foram para o vinagre. São as tais falhas regulatórias em que se homiziam pilantras impunes. Joe Biden e o Banco Central da Suíça garantem: ninguém solta a mão de ninguém, não importa o valor depositado. Afinal, os mercados são o povo, né? A razão é elementar para a entrada da mão visível do Estado: se não houver a garantia dos depósitos integrais, correntistas fugirão dos bancos menores, e surge o fantasma da crise sistêmica.

Continuo fã dos mercados, "como alguns de vocês", aludindo à coluna da semana passada. Sigo atento à sua capacidade de produzir maravilhas - se contido por parâmetros éticos - e horror, se entregue à própria natureza. Assim é com tudo o que é humano. Por aqui, muito horror se produziu em quatro anos, o que maravilhou os nossos gênios, saudosos da "destruição destruidora".

Essa gente vai gostar da proposta de arcabouço fiscal? Camões responde com outra interrogação: "Qual será o amor bastante de ninfa, que sustente o dum Gigante?"

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