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Como tornar a Polícia Civil mais eficiente?

02:00 | 22/04/2019

A grande aposta do Governo do Estado na área da segurança pública, o Sistema Policial Indicativo de Abordagem (Spia), baseia-se fortemente no conceito de mobilidade. Ao centrar suas atenções no monitoramento e na circulação de carros e motos, é possível identificar e coibir uma série de práticas criminosas. Um exemplo disso é a queda de 50% no roubo de veículos em janeiro deste ano na comparação com o mesmo período de 2018.

Trata-se de uma ótima novidade, principalmente quando levamos em consideração que muitas ações criminosas são realizadas com apoio de carros ou motos. No entanto, o incremento tecnológico da atividade policial precisa vir acompanhada de processos mais eficientes do que podemos chamar de "burocracia policial". A instauração e a condução dos inquéritos ainda são operadas por uma mentalidade "analógica" e pouco afeita à inovação. Não adianta possuir os melhores recursos no campo da informática sem investir na capacitação dos agentes.

Em junho de 2015, uma proposta de atualização da Polícia Civil foi apresentada pela coluna: a criação do Oficial de Polícia Judiciária (OPJ),que uniria as funções de inspetor e escrivão sob um mesmo cargo. Em teoria, a polícia ganharia maior agilidade ao concentrar sua atuação. Passados mais de três anos, contudo, muito pouco foi o avanço nesse sentido. Como forma de provar a eficiência do OPJ, o Sindicato dos Policiais Civis (Sinpol) conduziu um projeto-piloto na Delegacia de Aracati. Os resultados foram contabilizados e auditados por uma consultoria.

Para efeito de comparação, dois períodos da atividade policial foram selecionados: o terceiro trimestre de 2017 e o terceiro trimestre de 2018. Foram contabilizados diversos procedimentos policiais, como termos circunstanciais de ocorrência (TCO), boletins de ocorrências (BO), inquéritos policiais, flagrantes, mandados judiciais cumpridos e representações.

Operando de forma tradicional, a Delegacia de Aracati realizou 2.509 procedimentos a partir do registro de 798 crimes cometidos no período compreendido entre agosto a outubro de 2017. Mesmo tendo registrado um número menor de ocorrências (685), o projeto-piloto do OPJ produziu mais: foram contabilizados 2.653 procedimentos, um aumento de cerca de 6%.

Quando vistos sob a forma de números totais, o projeto OPJ não impressiona tanto. É preciso conferir seu impacto procedimento a procedimento para perceber o que mudou. Os termos circunstanciados de ocorrência instaurados ou encaminhados à Justiça aumentaram 28% e 60%, respectivamente. Os inquéritos policiais remetidos à Justiça apresentaram uma variação de 85% e os mandatos judiciais cumpridos obtiveram um crescimento de 196%. Os flagrantes oriundos de portaria cresceram 77%, enquanto as representações encaminhadas ao Poder Judiciário subiram 120%.

Conforme o Sinpol, o Ceará possui 616 escrivães de polícia e 1.846 inspetores. A equipe de uma delegacia plantonista conta, em média, com um delegado, um escrivão e três inspetores. Dificilmente dois flagrantes são lavrados de modo simultâneo porque o trabalho dos escrivães quase sempre costuma ocorrer de forma alternada, mesmo quando a equipe conta com dois profissionais, como revela uma fonte ouvida pela coluna. Quando a diferença de função é extinta, passa a haver a possibilidade de se contar com um "segundo" escrivão. Quem teve de encarar uma demora de horas para registrar um boletim de ocorrência sabe bem o quanto esse reforço pode ser útil.

Em um primeiro momento, a quantidade de ocorrências criminais aumentaria já que muita gente deixa de prestar queixa hoje por causa da burocracia. Com o tempo, o novo fluxo de trabalho seria capaz de traçar um perfil mais aproximado da criminalidade, reduzindo a subnotificação. Por óbvio que uma transformação como essa não ocorre de um dia para outro. Inspetores e escrivães terão de passar por uma capacitação complementar para se tornarem oficiais. Nada que não possa ser contornado, no entanto.

No Rio de Janeiro, o edital mais recente do concurso da Polícia Civil já abre vagas para oficiais de polícia civil - a nova nomenclatura para o oficial de polícia judiciária - e não mais para as funções tradicionais de policiamento.A ênfase governamental dada aos sistemas de informação e de videomonitoramento não pode deixar de lado dificuldades crônicas da instituição, em especial sua ênfase em uma cultura cartorial. Pouco valem os recursos tecnológicos do século XXI se aplicados em uma polícia cuja estrutura organizacional teima em permanecer no século passado.

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