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Interesse público e ético

01:30 | 23/06/2019

Entre os muitos debates e questionamentos que se levantaram com a divulgação das conversas atribuídas ao ministro Sérgio Moro e procuradores à frente da Operação Lava Jato, muitos deles chegaram ao jornalismo e à comunicação de uma maneira geral. A credibilidade das informações, a checagem dos fatos, a verificação dos dados e a exatidão sobre o que publicamos são alguns desses pontos.

É certo que um redemoinho invadiu toda a conjuntura nas esferas jurídica, política e ética com o desvendamento das conversas atribuídas aos agentes envolvidos. Enquanto os defensores do ex-juiz e hoje ministro Moro chamam de "grupo criminoso" os hackers que captaram as conversas pelos aplicativos, os acusadores contestam sua isenção em tratar do caso. Os veículos de comunicação do País todo parecem não ter se preocupado com os limites éticos da fonte com credibilidade.

Afinal, não é obrigação do jornalista só publicar algo após checar sua veracidade? E se o material todo tiver sido obtido de forma ilegal, estamos todos, jornalistas de todo o País, em desequilíbrio com o que aprendemos? Ao mesmo tempo, sabemos que é direito do jornalista resguardar o sigilo da fonte, como indica o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. A relação de quem concede a entrevista sob sigilo, a fonte, e de quem mantém a informação sigilosa, o repórter, é de confiança. No caso das conversas, porém, não foi uma relação consentida. Não se sabia - pelo menos é o que se supõe - que as conversas estavam sendo repassadas, nem que sob sigilo. Por isso, o debate.

Compromisso

Antes que o caro leitor, imbuído pela paixão em defender um ou outro lado, me escreva argumentando seu posicionamento, esclareço que não estou empenhada aqui em advogar por qualquer dos atores. As indagações, por ora e doravante, estão no campo da técnica jornalística, consolidada por um código de ética cujos procedimentos devem nortear a conduta do profissional.

Na edição do último domingo, 16, O POVO apresentou, na manchete de capa, a reportagem “O maior desafio da Lava Jato”. Na matéria interna, “Lava Jato contra a parede”, detalhou os elementos expostos pelo Intercept Brasil, com reprodução de falas, números da Operação e entrevista com o editor-executivo do site, Leandro Demori.

 

Um dos trechos da entrevista com Demori, em que fala sobre a origem das mensagens e o modo pelo qual elas foram obtidas, é: “O que interessa mais à população brasileira, ou seja, o que tem maior interesse público nesse debate? É a isso que se diz jornalismo. Jornalismo é uma profissão que lida fundamentalmente com interesse público. A gente serve à sociedade. Portanto, jornalismo é serviço”. O entrevistado tem razão quando fala em um dos critérios pelos quais se seleciona uma notícia - que seja interessante para quem a receba, que tenha uma importância para o público.

 

No entanto, é preciso não perder de vista a ideia de interesse público como princípio normativo do  jornalismo para justificar todo e qualquer tipo de conduta. A legitimidade da relevância pública se sobrepõe às violações de conduta no jornalismo? Qual é o peso que cada um tem no comportamento do profissional jornalista?

 

O compromisso com a verdade é um dos guias que todo jornalista deve ter no exercício de sua profissão. Independentemente do veículo em que se esteja, o profissional deve prezar  pela verdade sempre. No caso em xeque, tem sido essa uma das principais justificativas para a divulgação dos dados. Além disso, é necessário atentar para um valor muito caro para os dias de hoje - a transparência. Tudo tem sido, de fato, explicado? Métodos, metodologia e opções editoriais?

 

Em todo esse caso, como se está lidando com “o outro lado”? Todos estão sendo ouvidos e têm suas versões publicadas? Quanto à publicação das  conversas privadas, como foi feita desde o início pelos veículos que se propuseram a divulgar? Os jornais e demais veículos têm estado na esteira da divulgação dos fatos que o Intercept tem publicado aos poucos, por vezes repassando a alguns jornalistas, com exclusividade.

 

Inegável é a contribuição de toda essa articulação para a discussão de alguns pontos na política brasileira, quando feita sem paixões ou idolatrias. Porém a relevância para a democracia se evidencia quando ampliamos a discussão para as referências éticas, em todas as suas instâncias. No jornalismo, inclusive.

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