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Um debate que ninguém quer fazer
Vida & Arte

Um debate que ninguém quer fazer

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No dia 22 de março, a bancada governista no Congresso Nacional aprovou a Lei que regulamenta a Terceirização, assunto que estava na fila desde o ano de 2002. Segundo os defensores da referida lei, a mesma serve para diminuir os custos de contratação e a carga tributária nas empresas. Para os nobres deputados, depois de sancionada pelo presidente da República, o País voltará a crescer e o número de empregos e postos de trabalho aumentará substancialmente.

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Por outro lado, os críticos do referido projeto apontam para o desmantelamento da CLT, para o crescimento da precarização do trabalho, o fim dos concursos públicos, atrasos no pagamento de salários, fim das férias remuneradas e do
décimo terceiro salário.


Em se tratando do campo cultural, a precarização já chegou faz tempo, antes da que vem sendo implementada pelo Governo Temer. Senão vejamos:


É regra geral, por exemplo, em apresentações que um grupo e/ou um artista faz num centro cultural, num evento e/ou numa mostra patrocinada pelo poder público ou iniciativa privada, a necessidade de uma empresa para o recebimento do cachê, e geralmente é cobrado pela entidade um valor entre 5% a 15% do total do ordenado do contratado. Ou seja, a empresa recolhe os impostos, e o contratado, além de ter o cachê descontado vai pagar para a empresa os impostos (geralmente INSS e ISS), que não voltam para ele. A contribuição, que serviria para somar numa futura aposentadoria, vai para o governo. O próprio Estado estimula a prática, quando faz esse tipo de exigência em seus editais e chamadas públicas. É uma forma de fazer com que o orçamento para a Cultura cresça porque economiza nos impostos. Entretanto, produz uma relação precarizada com o trabalhador e de sonegação com o próprio Estado, porque deixa de recolher a contribuição do INSS patronal, a do INSS do trabalhador, a
do ISS e outros.


Consequentemente, muitos artistas e/ou grupos criam suas próprias empresas, e em alguns casos se especializam apenas em fornecer notas fiscais fugindo de sua função original que é produzir e fomentar a Cultura. Criou-se assim relações de poder e dominação entre os chamados “trabalhadores com CNPJ” e os “trabalhadores sem CNPJ”, quem reclamar fica sem receber e sem participar de editais e chamadas públicas. E se não se adequar fica sem trabalho e dignidade.


O atraso no pagamento do trabalhador da Cultura é uma realidade. Em vez de 30 dias, como é habitual, o cachê sai entre 45 a 120 dias, após o serviço prestado.

Quando não demora um ano.


Também é prática cada vez mais comum, os sindicatos de trabalhadores e associações de classe oferecerem como opção aos seus associados a previdência privada como alternativa à previdência pública, tão combalida e atacada atualmente nas chamadas reformas do Governo Temer. A impressão é que os próprios defensores dos trabalhadores da Cultura parecem ter “jogado a toalha” em relação à defesa da previdência social, à proteção e aposentadoria da categoria.


Diante do exposto, faz-se necessária a promoção de um debate amplo e franco sobre a precarização do trabalho, a previdência social, a terceirização laboral no campo cultural, através dos meios de comunicação, nas redes sociais, nos governos, nos fóruns de linguagens, sindicatos e associações de classe. Ou é um debate que ninguém quer fazer, por que será?


*Amaudson Ximenes é músico e produtor cultural

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