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O BNB tem que ser diferente dos outros
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O BNB tem que ser diferente dos outros

O Presidente do banco do Nordeste, Marcos Holanda, destaca o poder da instituição centrado nos recursos do FNE
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No próximo dia 19, o Banco do Nordeste completa 65 anos. O tempo de vida, porém, não garante “fila preferencial” ou “meia entrada”.

Historicamente o BNB enfrenta adversidades, seja em forma de desatenção em Brasília, seja na sua submissão às indicações políticas.

Hoje, em tempos nos quais a economia cambaleia e os bancos precisam se reinventar, sobretudo os públicos, comandar uma operação como essa não é mesmo fácil. E o Banco do Nordeste busca manter sua relevância. O poder do BNB está no dinheiro do FNE, um fundo constitucional, por vezes mal visto na equipe econômica por sugerir crédito direcionado - um palavrão aos ouvidos de quem é ressabiado com a política adotada no BNDES da Era Petista - vide o caso da campeã nacional JBS. No posto de presidente do BNB há pouco mais de dois anos, o economista cearense Marcos Holanda tem uma relação afetiva com a instituição. Nesta entrevista, gravada no gabinete dele, no Passaré, em Fortaleza, ele fala dos boatos recorrentes de que estaria para sair (“Trato cada dia como último, desde o primeiro”), do futuro - ele investe boa parte da energia em um Hub de Inovação - e faz uma provocação: “O Banco tem que ser diferente dos outros bancos públicos e o Banco claramente é. Tem FNE e microcrédito. Se os bancos públicos do Brasil forem iguais, basta ter um”.
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O POVO - Às vésperas de completar 65 anos, e historicamente enfrentando adversidades políticas, e considerando um momento em que os bancos precisam se reinventar, sobretudo os bancos públicos, de que modo o BNB mantém sua relevância?

 

Marcos Holanda - Primeiro, eu acho importante essa marca do banco de 65 anos. E até tem essa brincadeira com 65 anos, que é a idade de você vai se aposentar e seguir para a fila preferencial. Mas a grande marca deste aniversário é o momento em que ele mostra essa capacidade, talvez, muito singular, tão forte, de se reinventar e se renovar. Quer dizer, o Banco faz 65 anos, mas eu acho que o Banco, em termo de banco público e de desenvolvimento, está na fronteira do Brasil. É o primeiro banco público que criou um centro de inovação que já opera. Nós vamos lançar a maquete da estrutura definitiva, mas o FNE Inovação já está funcionando. É um banco que eu acho que tem criado naquela coisa que o ativo financeiro mais importante, que é o FNE, várias inovações como o FNE Água, FNE Sol, FNE Infraestrutura, FNE Semente. O Banco há 30 anos tem o FNE, mas tem tido essa postura de administrar o FNE de forma que cada vez mais eficiente, mais efetiva. Criando essa linha nova de crédito, criando essa nova forma de operar. Mas, fundamentalmente, você tem que olhar para frente. Qual o banco que eu quero ser para me justificar enquanto banco público? Sempre tenho colocado que os bancos públicos do Brasil estão num momento muito crítico. Se os bancos públicos do Brasil forem iguais, basta ter um. Por isso que eu tenho dito que o Banco tem que ser diferente dos outros bancos públicos. 

 

OP - O senhor considera que hoje o BNB é?

 

Marcos - O Banco do Nordeste claramente é.

 

OP - Por qual razão?

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Marcos - Porque o Banco do Nordeste tem duas coisas que só o banco tem. Só o Banco do Nordeste no Brasil tem FNE. Isso é uma coisa que só o Banco do Nordeste tem e outra coisa que só o Banco do Nordeste tem, praticamente, que é o microcrédito, o Crediamigo. Então o Banco do Nordeste hoje em cima basicamente 60% do banco é FNE e 40% é microcrédito. E são duas coisas que só o Banco do Nordeste tem, então o Banco do Nordeste, enquanto banco público, claramente é um banco que sabe o que quer, tem um diferencial e que tem que marcar esse diferencial com o microcrédito e FNE. Ao fazer isso ele marca o seu diferencial que é ser um banco de desenvolvimento do Nordeste. A missão do Banco, que foi ajustada há dois anos, é a missão que tem que ser uma coisa simples, direta e objetiva. A missão são basicamente estes motivos. Não é pouca coisa não. É ser o banco de desenvolvimento do Nordeste. Nós, inclusive, vamos relançar agora no aniversário do banco, uma reformulação do nosso logo. 

 

OP - O logo vai mudar?

Marcos - Pouquinho. Por quê? Porque o logo é uma assinatura. Então o logo tem que ter aquilo que o Banco se propõe a ter. Então no logo vai aparecer “O Banco de Desenvolvimento do Nordeste”. Isso vai ser incorporado ao logo. Porque eu acho que os logos modernos eles têm que ser assim. Você não assina? Você não tá dizendo que é o Banco do Nordeste? Então, vamos nos apresentar. Oferecer crédito de longo prazo na região só faz quem é banco de desenvolvimento e só faz por causa do FNE. Oferecer microcrédito pra quem está fora do mercado financeiro só faz banco de desenvolvimento. Nós somos o maior banco de desenvolvimento da América Latina. Portanto, não vou olhar pros outros bancos públicos. Eu tenho que entender o seguinte, o Banco do Nordeste hoje sabe o que é ser banco de desenvolvimento e ele que ser porque ele já é. Desde que ele faça bem feito essas duas coisas. Isso é um diferencial em termo do banco. O banco tem esse foco.

OP – Qual a sua definição preferida para inovação?

Marcos - Eu tenho usado uma definição no Banco que até tenho testado um pouco aí fora, tentando dar simplicidade e objetividade e digo: “Rapaz, inovação é fazer ou mais, ou melhor, com menos”. Se você consegue fazer mais, ou melhor, com menos você inovou. Então inovação não necessariamente, isso é uma coisa que tenho passado para o Banco, está associada a grandes tecnologias, a um produto novo. Se você pegar um produto que não é novo e aplicar numa região que aquilo dá um impacto alto, aquilo é inovação.

OP - E como o Banco acolhe as inovações?

Marcos - Outro dia chegou aqui uma proposta para a gente financiar uns equipamentos de uma indústria que ia cortar em 30% do consumo de água dela. Ah, mas não, isso não é inovação porque esse equipamento existe em todo canto. De fato, existe. Mas se eu pegar financiar algo, em um lugar que não tem água, em uma indústria que está consumindo 30% daquela água, se eu corto em 30% isso é inovação. Então inovação, do ponto de vista mais objetivo, é esse esforço de fazer mais, muito mais com menos ou esforço de melhorar a qualidade do negócio. Então, é isso que eu acho que tem que ser a missão e a mensagem.

OP - Da parte de quem este pouco entendimento?

Marcos - Eu acho que uma parte da sociedade, às vezes como um todo.

OP - De Brasília, sobretudo?

Marcos - De Brasília, das entidades de classe...porque às vezes olham pro FNE como um fundo que financia elite, financia fábrica de desodorante. Não é bem assim. Primeiro, ao fazer bem feito o FNE, tem que ter preocupação com os quatro “E” do FNE: Eficiência, eficácia, efetividade, ética. Fazer bem feito. Se você fizer bem feito, você dá permanência ao FNE. O FNE tem que ser entendido com um grande instrumento regional que o Brasil tem. Às vezes o FNE é raciocinado na lógica de política monetária, porque o FNE tem que ter juros. Às vezes o FNE é visto na lógica fiscal. Ah, o FNE não pode porque tem a questão do primário. E esquecem - e estou ficando um pouco preocupado - que a grande lógica do FNE é ser um instrumento de política regional, que o Brasil praticamente não tem mais. Então, agora para ser um instrumento de política regional, tem que ser bem feito. O custo do FNE tem que ser aplicado de forma muito eficiente, efetiva para poder gerar os resultados que precisa.

OP – O senhor acredita que as pessoas entendem o que é inovação?

Marcos - Não. Às vezes tem muita confusão.

OP – Então a gente ainda está num estágio de ter que explicar o que é inovação?

Marcos - De certa forma, sim. Eu tenho essa dificuldade aqui também no próprio Banco de explicar o que é.

OP - Dentro do Banco o senhor se depara com a necessidade de definir inovação?

Marcos - Porque de certa forma entrou em quase um modismo de todo mundo querer fazer inovação. Por outro lado, quando você fala de inovação, tem uma frase do economista-chefe Banco Mundial, o Paul Romer (economista e professor da universidade de Nova York), que eu adaptei e que eu gosto muito de usar. Quando ele entrou no Banco Mundial, ele disse: “Olha, todo mundo quer progresso, mas ninguém quer mudança”, e eu digo vou levar pra inovação: “Rapaz, todo mundo quer inovação, mas ninguém quer mudança”. Quando a inovação gera mudança, é um vamos ver. Então, a inovação é um negócio complexo. Já vi várias definições.
OP - O senhor trabalha para deixar a inovação como marca da sua gestão?

Marcos - Eu acho que isso é uma marca importante. Uma marca importante da inovação, enquanto instrumento pra atender a região. E a outra marca que é importante e que tem que cobrar desde o primeiro dia é de fazer muito bem feito o FNE. O FNE é o monopólio do Banco. O FNE é um ativo, não só do Nordeste, mas do Brasil. E às vezes existe pouco entendimento do que é o FNE.

OP - Dinheiro para o setor privado.

Marcos – Sim! Uma coisa boa é que o FNE é que ele não financia o Governo. Financia é o setor privado. Porque que o FNE está financiando infraestrutura? Porque o Brasil percebeu e finalmente quem está financiando infraestrutura é o setor privado. O setor público está esgotado. Então se precisa de estrutura precisa de mais. E quem tem recursos hoje é o setor privado. Então esses R$ 2 bilhões que nós estamos colocando no Nordeste são financiamento privado em infraestrutura e isso é muito bom. E a gente tem mais fôlego para avançar. Semestre que vem, é muito provavelmente, nós teremos o Aeroporto de Fortaleza e o de Salvador, além de novos projetos de solar, novos projetos de eólica, alguma concessão que a gente pode financiar na parte de rodovias. Tem que colocar o Banco, tem que, talvez, colocar saúde nas infraestruturas sociais. O Banco pode financiar mais infraestrutura de saúde. Pode financiar mais infraestrutura de educação. Ensino médio precisa de muita estrutura, porque as escolas de ensino médio têm uma coisa interessante...

OP - A rede privada?

Marcos - Não, apenas. Pública também. México tem muito isso. Chile tem muito isso. Que é? O setor privado financia a construção e manutenção da escola e o Governo fica com os professores e a parte didática. Resultado: escola boa, bem mantida e funcionando. Diretor não está preocupado com luz, com coisa. Diretor está preocupado com professor. E o setor privado sabe que aquilo é rentável. Ele constrói e mantém. Então esse espaço, no ensino médio, diferente do ensino fundamental, a escola tem que ser atrativa se não o jovem não vai. O jovem já tem poder. Com 15 anos, olha pra escola e pensa que não vai. Por que as escolas americanas (high school) e europeias são tão boas? Porque têm que atrair, tem que ter esportes, tem que ter instalações boas. Então, o Banco pode financiar mais, de água, de saneamento, nós temos projetos. Fizemos no ano passado um financiamento de quase R$400 milhões para o saneamento lá de Salvador em Feira de Santana. Temos novas propostas. Se tem uma estrutura que o Banco quer financiar e deve financiar é água e saneamento. A externalidade é altíssima, ganha prefeitura, ganha secretaria da saúde por causa das doenças, ganha o comércio, porque uma cidade hoje bem equipada atrai mais investimento.

OP - O secretario de Acompanhamento Econômico, Mansueto Almeida (cearense também), postou no Twitter uma defesa da aprovação da TLT no lugar da TJLP. Ele fala que o governo passado emprestou muito mal, sem garantia desses retornos e a mudança na taxa seria uma solução pra baixar a conta do subsidio. Em que medida o FNE está fora desta conta de subsídio?

Marcos – De forma direta não. A TLT vai ser uma evolução importante para o Brasil. Vai ter uma taxa que tem pouco mais de longo prazo, mas lembrando, de forma direta, se a TLT é juro que vai financiar a dívida pública e o BNDES emite dívida pública pra emprestar até o juro direto e subsidio direto financeiro. No Banco do Nordeste não existe esse subsidio direto financeiro. O FNE não é financiado por dívida pública. É uma transferência de recurso do Orçamento do Governo. Não tem juros financeiros diretos. O que tem é o conceito de custo de oportunidade. Dinheiro que era receita do governo e que podia passar para a Saúde e Educação e foi financiar um fundo. Mas um fundo com propósito regional. Porque se fosse para a Saúde e Educação, infelizmente, em nível de orçamento federal o recorte é pouco. Então a gente tem que entender de não ter receio, vergonha, nós nordestinos. O Brasil precisa de política regional, precisa trabalhar de forma diferenciada. É credito direcionado? É credito direcionado, mas é por região. Não é para empresa A, B ou C. É por região e por ser direcionado tem que oferecer mais atrativo.

OP - O que seria do Nordeste sem o FNE? O que sobraria na visão de economista, não só como presidente do Banco?

Marcos - Você tem todo aí um parque industrial de serviços que se não fosse a FNE não teria. Desde o pequeno para o grande. A Fiat está em Pernambuco por isto. Sem o FNE, sobraria um Nordeste com menos infraestrutura, um Nordeste com menos plantas e capacidades de ofertar serviços. Lembrando o que eu digo: o paradigma do mundo mudou. A luta pelo desenvolvimento econômico não é atrair a indústrias, mas pessoas. Seja um engenheiro na Fiat ou um metalúrgico na CSP. Para atrair pessoas tem que ter infraestrutura urbana boa, você tem que ter empresas que as pessoas queiram trabalhar. Investir só em educação e saúde é uma visão ciclista. Quantos anos a gente vai levar para a gente formar alunos tão bons quanto Sul e Sudeste. Tem de fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Ao mesmo tempo tem que atrair infraestrutura, atrair indústria. O FNE tem essa coisa. A experiência do FNE é quase única no mundo. Acho que não existe nenhum fundo de desenvolvimento regional tão grande e com essa característica de estar amarrado na Constituição. Esta decisão há quase 30 anos tem que ser respeitada. A Constituição diz “o FNE tem que defender condições diferenciadas em termos de prazo e de juros e em termos de condições”. Então temos que fazer isso todo dia e cobrar mais. Um dos pais do economista-chefe no Etene, criado há dois anos (já na gestão de Marcos) é avançar mais na avaliação dos empréstimos do FNE. Temos que ter confiança de mostrar pra sociedade que o dinheiro do FNE causa impacto, gera emprego.

OP – O que é a ideia do pesquisador visitante?

Marcos - Em agosto nós vamos começar a operar a figura do pesquisador visitante do Etene. Oferecer bolsas. O professor PhD não conseguiu mercado privado e quer passar seis meses aqui estudando, vai ter financiamento e recursos e complemento de salário dele. E nessa agenda com dados de fora, nós estamos trazendo um pessoal bom nessa área de microeconometria, que mede impacto das intervenções públicas.

OP - Já sabem o lugar da agência vitrine em Fortaleza?

Marcos - Nós estamos procurando.

OP - Qual a diferença dela paras outras?

Marcos - Serão de porte maior, nasce com a lógica da agência do futuro. Além de Fortaleza, começa por Salvador e Recife. Em janeiro ou fevereiro já operando.

OP - Como é que o banco lida com TI hoje? O mundo vive a necessidade de defesa contra ataques. Que tipo de medidas o Banco está tomando?

Marcos - É um grande desafio. O Banco realmente precisa avançar na TI, mais que as outras indústrias. Muita gente se anima com essas coisas high tech, como o Banco Original (banco do Grupo J&F – dono da JBS - sem nenhuma agência física). Banco tem que entender o que é e fazer a tecnologia rodar para aquilo que ele é.Tem coisas super legais para o cliente de banco comercial pessoa física que para o Banco não é. Nós temos investido pesadamente Vamos investir em TI para microcrédito. Plataformas digitais para microcrédito. A nossa pessoa física, como banco, não são Jocélio ou Marcos. São as MPE. Em setembro vamos lançar o conceito da MPE Digital. Haverá agência virtual para atender este público de Micro e pequenas empresas. Abre a conta e é atendido assim. Virtualmente.

OP - O que o senhor tem feito para gerar mais negócios com o dinheiro do FNE?

Marcos - Eu tenho cobrado resultados concretos. O Banco pode ser mais agressivo no uso de FNE para financiar infraestrutura. Eu tinha colocado no primeiro semestre de 2016, no ano passado, nós financiamos zero de infraestrutura. Este semestre estamos fechando com R$ 2 bilhões de financiamento de infraestrutura. Esta é uma área em que o Banco pode ser mais agressivo. Usar esses recursos. Ganha o Banco, ganha a região. O problema do Nordeste é que a infraestrutura que é pobre, não é porque a gente é pobre de ideia, capacidade empresarial. A infraestrutura é pobre. Então vamos financiar. Isso é óbvio que o FNE tem que ser que mais agressivo, porque não é o Banco que controla isso. Por que o FNE não oferece juros mais atrativos pra infraestrutura? O Brasil não está precisando de infraestrutura? O Nordeste não está precisando de infraestrutura?

OP - O senhor avalia que o BNB é favorito para financiar os investimentos nestes dois aeroportos (Fortaleza e Salvador)?

Marcos - Sim, a conversa está bem, estamos em contato com os dois bancos que estão assessorando as duas empresas (em Fortaleza, a alemã Fraport, em Salvador a francesa Vinci Airports). Se eles fizeram as contas, e como o Banco tem condições melhores, por que não optar pelo Banco?

OP - O que o senhor pensa do mercado de capitais para desenvolver a região?

Marcos - Eu acho que é importante e acho que eles têm até participado de alguns fundos que financiam startups, o que é muito importante por trabalhar com capital de risco. O FNE na sua lógica não pode trabalhar com mercados de capitais, mas eventualmente vai ter que enfrentar essa realidade no Nordeste porque é necessário. Mas mercado de capitais naquilo que a região tem mais carência. Para financiar grandes grupos, grandes investimentos não vejo sentido. Já que já se faz isso. Seria mais para inovação, startups.

OP – E a sua relação com a Diretoria, como é?

Marcos -  Sim, é boa. É uma diretoria boa e algo importante que está acontecendo é que a Diretoria tem funcionários de carreira (no dia seguinte foi confirmado o nome de Cláudio Luiz Freire Lima, funcionário de carreira, para diretor de Administração). Isso é sempre bom porque mostra a empresa crescendo internamente. O próprio presidente do Conselho de Administração. Me dou muito bem com ele, o Ricardo Soriano. Aliás, se tem um conselho no qual os conselheiros se sentem confortáveis é o do Banco do Nordeste.

OP – Por que?

Marcos – Porque os outros estão com mais problemas (risos). Eu acho que a própria lógica do que que o Banco quer, quais são as prioridades, as estratégias são muito claras. O próprio BNDES a Maria Sílvia (ex-presidente) estava lá fazendo planejamento estratégico com Banco Mundial, especialistas do mundo todo. E eu brinquei: o que ele vão passar aí três dias para fazer vai gerar estratégia que já é a nossa. Dito e feito. Micro e pequena, inovação, meritocracia...Não precisamos contratar. Ele levo muito a sério aqueles quatro princípios: meritocracia, integridade, ética, inovação. Fazendo isso ele se preserva e enfrenta ambiente cada vez mais competitivo.

OP – O que levou o BNB a abortar a licitação para agência naquela altura do certame, na reta final?

Marcos - Eu levo a sério o que eu falo. Se eu acho que levo a sério competição, então a gente percebeu que no meio do caminho que podia ter mais competição. Quando tem mais competição, o Banco ganha porque o Banco é público e a sociedade ganha. Eu vi que tinha espaço para mais competição. Não faz mal a ninguém. A decisão fundamentalmente foi por mais competição. Quem for não tem problema. A gente percebeu que o caminhar ficaram só três, de 19. A lei permite que nesse meio do caminho, o ente público, em vendo uma oportunidade de corrigir algo, pode mudar. O que eu quero é mais competição.

OP – O BNDES tem linhas em áreas onde o BNB atua, como em energia. Já o BB fechou linha como Governo do Ceará. Ou seja no terreiro do BNB. Há autofagia entre os bancos federais?

Marcos - Às vezes o próprio Banco entende que é competidor. Mas digo que não devemos ir pela competição. Nós temos de entender os bancos como complementares. O BNDES é um banco de desenvolvimento nacional e o Banco do Nordeste regional. Ah, mas vai ter dois bancos? Vai. Porque a lógica regional vai surgir dos dois bancos atuando na região. Não vejo problema. Quaro mais investimento no Nordeste melhor. Já os outros bancos, penso que devem encontrar os seus nichos. Se for tudo igual, basta ter um. Precisa ter essa preocupação. O Banco precisa olhar o dia a dia e olhar a instituição para frente. Quanto mais competição, melhor. Então eu não tenho duvidas de que por questão financeira, quem deverá financiar aeroportos seremos nós. Se preocupe com o BNDES no sentido de eu sempre melhor. Ser mais ágil, ser mais conhecedor da região. 

OP– O senhor tem posicionado o Banco em termos de inovação, mas o resultado não é imediato.

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Marcos - E eu acho que a grande lição do banco nos seus 65 anos é exatamente ser cada vez mais um banco em desenvolvimento. Não se engane, o Nordeste só vai sair dos 13% de participação na renda nacional quando aplicar mais fortemente em inovação. É onde está o valor agregado, onde está emprego de qualidade, onde está a riqueza que o mundo está criando. A gente foi recentemente lá a Israel e reviu.

Você ver esse movimento super interessante lá do cara da França (o novo presidente, Emanuel Macron). A primeira coisa que ele fez: Dez bilhões ou 15 bilhões de euros. E ele disse, “Rapaz a minha prioridade é inovação, eu vou transformar a França numa nação de startups”. Que é o mesmo de Israel. Israel hoje tem como lema o startupnation. Nós somos o país das startup. Portanto, o Nordeste não tem que ficar olhando para trás. Invista em inovação de forma objetiva. Então o Banco também está fazendo isso. 

 

OP - O Banco aplicou apenas 70% da meta do semestre do FNE. A então presidente Maria Sílvia (BNDES) foi acusada por empresários de ter segurado dinheiro e isso a derrubou. Como conciliar esse rigor que o senhor fala com a efetividade dos negócios do Banco?

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Marcos - É. Esse é um raciocínio e uma coisa que está muito atual e que temos que tomar cuidado. É óbvio que o FNE tem recursos disponíveis, agora o raciocínio fácil e às vezes enviesado, no sentido de enfraquecer o FNE, é que agora está com recurso disponível e o Banco não empresta. A gente tem que entender de imediato que estamos na pior recessão que o Pais já teve, não é das duas últimas décadas, três décadas, é de toda a história do Brasil. Estamos na pior recessão. E é óbvio que as regiões mais pobres as recessões doem mais. Então é obvio que em uma recessão brutal como essa demanda que o crédito diminua. E aí você como banco de desenvolvimento responsável pela região você também não pode emprestar por emprestar para também não ter recursos disponíveis. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto, queira ou não queira, que a gente percebe que existe um impacto, as taxas de juros do FNE, quando você combina com recessão brutal com os juros, a demanda diminui e é eventual você ter disponibilidade. Então o debate não é simplesmente fácil como sugerir que o FNE seja reformulado, que deve financiar outras coisas, porque tem recursos disponíveis. A gente tem que tomar muito cuidado enquanto nordestino com esse discurso. Não é bem assim. A gente não pode pegar um momento excepcional. O FNE sempre aplicou a totalidade os seus recursos. Não é em momento excepcional, que sobra algum recurso e aí o Banco não sabe emprestar ou o Nordeste não precisa deste dinheiro. 

 

OP - Como fazer com o que um banco público tenha políticas que não sucumbam com quem está na Presidência?

 

Marcos - Basicamente, mostrando a sociedade o que ela faz e a sociedade cobrar. Por que deixou de fazer isso e por que deixou de investir em inovação. Por que o Etene (Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste, unidade de pesquisa do BNB) não continuou se abrindo para o meio acadêmico e virou uma coisa interna? As instituições têm de se fazer necessárias. Os órgãos de controle fiscalizam muito o Banco e isso é bom. Não vejo problema. As instituições têm de abrir para a sociedade para que a sociedade não abra mão deste banco. Caso se fechem, vão perdendo relevância. 

 

OP – Comandar um organismo estatal é sempre delicado. Como motivar o time?

 

Marcos – No começo deste ano, nós fizemos algo que foi a maior da história, pelo menos foi o que me informaram. Fizemos o maior rodízio de gerentes na história do Banco do Nordeste. Na lógica de meritocracia e na lógica de performance. Pode ser, eu brinco às vezes, não pode ter gerente de banco, nem nenhum gestor como rainha da Inglaterra, que só vai para evento social.

 

OP – Houve muita resistência?

 

Marcos – Claro, mas a grande maioria percebe que isso é a lógica das oportunidades.

 

OP – As mudanças foram dentro de uma mesma cidade?

 

Marcos: Não, em várias cidades e estados. Às vezes o gerente muda de cidade ou vai de uma agência top e cai para outra menor porque não estava performando. Não tem mais dono de lugar. Tem que ter performance. É uma mensagem importante para o Banco poder performar melhor o FNE.

 

OP – O mundo bancário está mudando muito e opera cada vez mais com menos gente. Como o senhor lê esta tendência que parece irreversível (Dois dias depois o BNB anunciou programa de demissão voluntária)?

 

Marcos – O mundo bancário está mudando mais rápido que outros setores. Então a preocupação do Banco de perceber a realidade é uma coisa para ontem. E o que eu tenho dito é que importa menos para mim a quantidade de funcionários e salários, quanto ganham, é que o Banco deste tamanho se justifique e se pague. O Banco tem que mostrar que está se pagando. E o que é isso: é tratar bem o cliente e ser fundamental para a região. Nisso tem uma mudança. 

 

OP – Nunca se fechou tanta agência bancaria no País. Qual o sentido das agências?

 

Marcos - Estamos criando e vamos começar, provavelmente, por Fortaleza, na revolução da agência dos bancos, uma agência vitrine.

Cada capital vai ter uma agência de referência. É ali onde o Banco mostra para a sociedade o que ele é. As agências estão deixando de ser o lugar de pagar e receber contas, para se tornar um lugar de negócios.

O banco mais moderno de Israel trabalha com o horizonte de cinco anos se tornar consultor financeiro. O dia a dia faz no celular. Você vai à agência para tomar uma opinião do gerente para conhecer o que tem de negócio.

 

OP - Quais as chances de o BNB financiar os investimentos nestes dois aeroportos (Fortaleza e Salvador) que foram leiloados?

 

Marcos - A conversa está bem, estamos em contato com os dois bancos que estão assessorando as duas empresas (em Fortaleza, a alemã Fraport, em Salvador a francesa Vinci Airports). Se eles fizeram as contas, e como o Banco tem condições melhores, por que não optar pelo Banco? 

 

OP: Para tocar o Hubine, o senhor anunciou uma obra física. Qual o sentido do investimento e como o Banco pretende trabalhar o custeio?

 

Marcos – A estrutura física é para gerar externalidades e gerar inovação. O Nordeste tem pouca infraestrutura física para promover inovação. É o que se chama de ecossistema da inovação. Espaço para as pessoas que querem empreender se reúnam, troquem ideias.

Infelizmente o Nordeste não tem. Agora vamos trazer isso. Um banco de desenvolvimento não pode ser omisso a isso. Ele tem de dar aos nordestinos empreendedores condições físicas que lá no Sul e Sudeste tem. Coworking, incubadoras...

 

OP – Ficando em Fortaleza, como vai atender aos outros estados?

 

Marcos - Nossa estratégia é iniciar o Hubine em Fortaleza, mas vamos ter, no mínimo em cada estado. É uma rede. Final do ano que vem creio que esteja pronto.

 

OP – E o custeio?

 

Marcos: Como vou financiar? Trocando ativos. O Banco tem ativos hoje, como o apartamento para o presidente (na Beira Mar de Fortaleza), agência desativada como a de Brasília, há três anos sem uso. Vende ativos e financia a parte física. Servem muito mais à sociedade do que hoje. O Banco já tem um Fundo para isso, o Fundeci (Fundo de Desenvolvimento Econômico, Cientifico, Tecnológico e de Inovação). Vamos robustecer para que ele assuma parte do custeio dos Hubines. O Fundeci pode estar aberto legalmente para receber aportes de capital privado. O banco entrou em projeto para trabalhar com água com a Coca-Cola, por exemplo,. Cada um pôs R$ 10 milhões. E a estrutura de pessoal é pequena.

 

OP - O senhor foi alvo de uma forte onda de boatos, dando conta de sua saída. Como o senhor lidou com isso, como é que agir como técnico em cargo com nomeação política e como é ter uma diretoria nomeada também sob indicação política?

 

Marcos - Primeiro essa coisa da indicação política é secundária na medida em que as pessoas que foram eventualmente indicadas tenham de se justificar como técnicos, no papel do dia a dia. Eu desde que entrei no Banco administro como se todo dia fosse o último. Todos os dias eu faço o que tem que ser feito no Banco. Essa questão realmente é secundária. Eu estou com essa preocupação de fazer, eu não tenho duvidas de que é importante para região e tenho que colocar o Banco para frente e não para trás. É um banco indispensável para a região. 

 

OP – O senhor tem uma relação afetiva com o Banco, não é?

 

Marcos – Tenho. Meu pai foi funcionário de carreira (o economista Arilo Holanda). Meu pai de certa forma participou de um banco que não existe mais, de um banco menor, mas importante, mas talvez mais político, mais patrimonialista. E quando converso com ele, é óbvio que ele tem interesse, eu digo: ‘olha mudou muito, mas não fique incomodado não. Porque a gente tem de pensar no Banco para frente.

Tenho a convicção de que o Banco não pode menosprezar esta necessidade de se justificar para a sociedade de que ele vale a pena e que o Nordeste está financiando. Se não tiver esta confiança, de que aqui tem dinheiro público, o Banco entra em um caminho errado. Por isso que eu digo ser necessário este senso de urgência. Não pode se acomodar e ficar com defesas que eu usava há 20 ou 30 anos. 

 

OP - O senhor tem uma origem acadêmica, mas já é um homem de gestão pública há algum tempo. Passou pelo Ipece antes do BNB. O que o senhor descobriu quando saiu do campus para a gestão pública? A academia formas bons gestores?

 

Marcos - A academia forma gestor em potencial, mas para o gestor real surgir ele tem que ir para o Governo ou para o setor privado.

Porque às vezes se acha que é gestor lá na teoria e tudo. Resta aproximação da academia com o setor privado ela tem de acontecer e é irreversível. E é aquela coisa. Sou professor da Universidade (do Mestrado em Economia da UFC, o Caen) e tem aquela história. Essa coisa de que você tem de mudar com o mundo e não deixar que o mundo mude você eu vejo que a Universidade está um pouco neste segundo cenário pior. Não está conseguindo mudar com o mundo e quando o mundo mudar com a Universidade, ela ohhh...Ela tem que mudar mais rápido. Tem universidade que foi criada com 4 mil alunos e tem 600 funcionários. Meu Deus! Como é que pode? (A federal Unilab, com sede em Redenção (CE), tem esta proporção).

 

OP – Há uma clara disseminação do pensamento liberal na economia, talvez por conta da derrocada do projeto de poder do PT. Posso definir o senhor como um liberal e o que o senhor pensa disso?

 

Marcos - Na verdade, eu me incomodo um pouco. Eu acho passado essa coisa de liberal, conservador, direita e esquerda. O mundo mudou muito. Eu acho que falta um pouco de entendimento. Tem que entender o que é. Eu tenho dito: qual é a grande política social de esquerda vangloriada pelo Brasil? Bolsa família. Renda mínima é uma proposta do Milton Friedman, que é o mais liberal dos liberais. Então, o que a esquerda diz é a política mais liberal. Renda mínima significa tirar o Governo da economia. Em vez de ter Governo, dá o dinheiro. Esta coisa está ficando mais irrelevante. Por exemplo, inclusão financeira e social.

Por que não é liberal? É liberal. As pessoas têm de ir para qual o propósito da política. Acho que o mais moderno em termos de política pública é essa coisa de oportunidade - não necessariamente igualdade de renda - e foco em quem mais precisa. Independente de quem for tem que ser este o caminho. Foco no resultado. 

 

Perfil 

 

Marcos Costa Holanda, 58, tomou posse como presidente do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) no dia 15 de maio de 2015.Ele é professor do Departamento de Economia Aplicada da Universidade Federal do Ceará (UFC). Economista formado pela Universidade de Fortaleza (1984), engenheiro civil pela UFC (1983) e mestre em Economia pela Fundação Getúlio Vargas - RJ (1987) e doutor em Economia - University of Illinois (1993). Antes do BNB, dirigiu o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece).   

 

O POVO Online 

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