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Arte urbana. Qual é o valor do grafite?
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Arte urbana. Qual é o valor do grafite?

Cultura: Entre murais apagados em São Paulo e a sugestão de um projeto de lei para valorizar o grafite em Fortaleza, O POVO discute o potencial cultural, turístico, econômico e social dessa manifestação artística
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Renato Abê

renatoabe@opovo.com.br
 

Morador do bairro Caça e Pesca, o artista urbano Bulan responde prontamente quando perguntando sobre o valor do grafite. “Para mim, foi uma porta aberta, uma oportunidade de mudar minha vida. Hoje eu viajo o Brasil inteiro com meu trabalho”, aponta, defendendo que a arte urbana é uma importante ferramenta social. “Onde o governo não chega com educação, o crime está e, quando o jovem tem acesso à cultura do grafite, ele pode abraçar uma causa, ganhar voz”, completa. O artista de 24 anos integra a produtora Batuque do Coração, que realiza cursos, palestras e oficinas para trabalhar a cultura hip hop pela periferia Brasil afora.

[SAIBAMAIS]
Já o empresário David Oscar Vaz consegue dimensionar o valor do grafite em retorno financeiro. Ele é dono de estabelecimento próximo ao Beco do Batman, point da arte urbana em São Paulo que está estimulando bares e restaurantes. “Essa tendência da arte de rua é muita positiva para movimentar a economia das cidades. Por aqui, atrai não só o turismo local, mas também vem gente do exterior”, destaca o proprietário do Bistrô Ó-Chá, na Vila Madalena.
 

Seja em Fortaleza, em São Paulo ou na maioria das grandes cidades pelo mundo, o grafite é realidade viva – e colorida – nas paisagens urbanas. Apesar de, desde a década de 1970, ser difundida mundialmente a partir de Nova York, a manifestação ainda é território de disputa e incompreensão. A exemplo do que aconteceu esta semana com as obras da avenida 23 de maio, em São Paulo, que foram apagadas pela gestão do prefeito João Dória (PSDB), o grafite ainda segue tendo que garantir espaço.
 

“Nenhuma arte é totalmente aceita. A questão é que o grafite, em especial, tem de negociar com os espaços, discutir com a cidade”, afirma a historiadora da arte Carolina Ruoso. Para ela, o que aconteceu em São Paulo vai na “contramão” da tendência das grandes metrópoles, onde estão sendo criados roteiros turísticos e as prefeituras estão investindo orçamento público para os artistas preparem novos painéis e murais.
 

Pesquisadora e curadora do Sobrado Dr. José Lourenço, Carolina destaca que em muitas cidades mundo afora (Londres, Nova York e Dresden, por exemplo) o grafite já está firmado dentro da lógica da atratividade turística. A capital cearense, aponta ela, está crescendo nesse sentido. “Fortaleza está se consolidando como uma capital da arte urbana com eventos como o Festival Concreto. A Cidade está atraindo artistas de outros países, porque eles querem ter uma obra numa capital cultural”, pondera. “É um campo todo aberto de possibilidades para o mercado criativo, que precisa de investidores interessados em propostas inovadoras”, aponta, destacando ainda toda a “indústria de souvenir” que pode surgir a partir das obras.
 

O artista urbano Weaver Lima concorda que, além da força cultural, o grafite tem potencial pelo viés turístico e da economia cultural, especialmente com convites que grafiteiros têm recebido da iniciativa privada. Ele, porém, afirma ser importante alguns ajustes nesse novo mercado. “Tem muitos grafiteiros que ainda são avessos a tratar o grafite de maneira profissional, comercial. Por outro lado, as próprias gestões empresariais que contratam nosso serviço chamam artistas para trabalhos muito padronizados. É importante respeitar o trabalho autoral de cada artista”, contrapõe.
 

Enquanto arte pública, destaca Weaver, é importante que o grafite tenha seu valor simbólico compreendido pelas cidades. “É uma questão de cidadania, de fugir dessa ideia de que o que é público é de ninguém, porque é o contrário: aquela arte é um bem de todos”, assegura.

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