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Aplicação de penas alternativas ainda é escassa no CE
Cotidiano

Aplicação de penas alternativas ainda é escassa no CE

Entidades que atuam no judiciário criticam aplicação exagerada de encarceramento e a subaplicação de medidas cautelares
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Encarcerados temporariamente por furto de livros, pneu de bicicleta e camisa de futebol convivem, no sistema penitenciário do Ceará, com pessoas condenadas por crimes hediondos e integrantes de facções criminosas. A estimativa é de que pelo menos um crime de baixo potencial ofensivo é analisado por dia na Vara Única de Audiências de Custódia de Fortaleza, segundo a Defensoria Pública do Estado. Entidades criticam a aplicação exagerada de encarceramento e dizem que medidas alternativas são subaplicadas.

 

Em um dos casos, conforme a Defensoria, um homem está na Casa de Privação Provisória de Liberdade Elias Alves da Silva (CPPL IV) cumprindo prisão preventiva após ser flagrado tentando furtar pneu de uma bicicleta do Bicicletar. Na mesma penitenciária está outra pessoa, com a mesma decisão da Justiça, acusada de furtar duas camisas de clube de futebol no Centro.


Em junho do ano passado, O POVO contou a história de um jovem, de 20 anos, suspeito de furtar livros. Ele ficou dois meses preso pelo crime. A intenção, alegou, era estudar para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Conforme defensores públicos, no caso dele e em situações semelhantes, além da privação de liberdade ser decretada para crime pouco danoso, o valor aplicado da fiança, normalmente, é superior ao dos objetos furtados.


“A reforma do Código de Processo Penal trouxe diversas medidas cautelares. Ficou claro que a prisão preventiva só deve ser decretada em último caso, mas isso não está sendo aplicado”, criticou Delano Benevides, defensor público do Núcleo de Assistência ao Preso Provisório e às Vítimas de Violência.


De acordo com relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgado no início deste ano, o Ceará é o terceiro estado do Brasil com maior número de presos provisórios. Conforme a pesquisa, do total de presos do Estado, 66,9% dos detentos não foram julgados.


Para o defensor público, essa união entre envolvidos em crimes hediondos e aqueles que cometeram furtos, receptação e roubos “simples” provoca a “profissionalização da criminalidade”. “A pessoa chega por ter cometido um pequeno furto e, lá dentro, vai se ver obrigado a participar de facções”, aponta Delano Benevides.


Ressocialização

Presidente da Comissão de Direito Penitenciário da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB-CE), Márcio Vitor Meyer de Albuquerque lembra ainda que a falta de condições que propiciem a ressocialização contribui para a reincidência de cerca 70% dos presos do Estado. “Muitas prisões estão sendo dominadas pelo crime organizado, o que confirma a falta de controle do Estado, bem como alto risco para a sociedade e para aqueles apenados que poderiam ser ressocializados”, critica.

 

Marlúcia de Araújo Bezerra, juíza da Vara Única Privativa de Audiências de Custódia, explicou que para as “penas alternativas” serem aplicadas são necessários alguns requisitos. Além do crime não ter sido violento e a pena não ser superior a quatro anos, os antecedentes e a personalidade do acusado são avaliados. Por isso, segundo ela, nem sempre o benefício é aplicado.


O POVO questionou o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) sobre presos por crimes de baixo potencial ofensivo e como as medidas cautelares poderiam ser alternativa nesses casos. Contudo, os questionamentos não foram respondidos. 

 

Resumo da série


Em dois dias, O POVO discutiu a situação dos presos provisórios do Ceará. Conforme a Defensoria Pública do Estado, mais de 90% dos detentos com este perfil permanecem encarcerados mais tempo do que deveriam. E ainda são poucos os casos de aplicação de penas alternativas, indicam entidades e atores do sistema.

 

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