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García Márquez em Paris
Foto de Socorro Acioli
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Escritora e jornalista com doutorado em estudos da literatura pela Universidade Federal Fluminense. Ganhou o Prêmio Jabuti, na categoria de Literatura Infantil com o livro

García Márquez em Paris


De dezembro de 1955 a janeiro de 1957, Gabriel García Márquez viveu em Paris. A lista de escritores do mundo todo que passaram uma temporada nessa cidade é quase infinita, e eles continuam vindo. Sentam nos cafés, com seus molesquines, echarpes vermelhas e olhar perdido. Vejo inúmeros por aqui. Escrevem suas obras para que o mundo as conheça um dia. Ou nunca. É o delicioso risco do escritor.


O caso de García Márquez foge totalmente do lugar comum e é cheio de detalhes que fizeram sua temporada parisiense muito especial. Ele veio como jornalista, correspondente do jornal colombiano El Espectador e tinha a missão de escrever crônicas sobre as questões políticas, sociais e culturais da Europa. Ele não falava francês, mas seus amigos da época contam que aprendeu com facilidade ouvindo as canções de Georges Brassens. E lendo, é claro.


As coisas iam bem para o jovem jornalista colombiano até que o ditador Gustava Rojas Pinilla fechou o El Espectador, e García Márquez se viu, de repente, desempregado em Paris. Àquela altura, ele tinha o dinheiro para a passagem de volta, e o mais prudente seria retornar à Colômbia para resolver a vida a partir dali. Mas não foi essa a sua escolha. Nem sempre a prudência mostra o caminho mais fértil para um escritor. A força da escrita, muitas vezes, aparece nos atalhos.

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García Márquez estava trabalhando em um projeto literário, e Paris era o lugar ideal para isso. Ele começara a escrever o romance Ninguém escreve ao coronel, inspirado na lembrança sobre os veteranos de guerra que conheceu e de quem ouviu falar.


García Marquez começou a usar o dinheiro da passagem de volta para se manter. Comia o mesmo macarrão barato todos os dias e costumava cantar boleros no café L’Escale, na rue Monsieur Le Prince, para ganhar alguns trocados.


Em entrevistas sobre esse período, ele costumava dizer que foi muito feliz, mesmo mal tendo o que comer.


Os recursos financeiros estavam acabando, e seria impossível pagar a dívida do hotel onde vivia, em um quarto minúsculo com aquecimento precário. Por sua sorte, a dona do hotel dispensou o pagamento e deixou que ele ficasse de graça pelo tempo que precisasse. É preciso lembrar que, nessa altura, García Márquez era um jovem jornalista colombiano desconhecido. Nos anos oitenta, quando já era então um autor muito famoso, Madame Lacroix deu uma entrevista e disse que o ajudou porque via que ele estava em Paris para trabalhar. Enquanto seus amigos saíam para beber, sua máquina de escrever não parava de fazer barulho nem por um minuto.


Uma das coisas que mais o marcou nessa temporada foram as idas quase diárias aos cinemas ao redor do hotel. A paixão cresceu tanto que o levou a estudar cinema em Roma, anos depois, e a fundar a Escuela de Cine y TV em San Antonio de Los Baños, Cuba, no ano de 1986.


O Instituto Cervantes encomendou ao pesquisador Gerald Martin a criação da Rota García Márquez em Paris. Trata-se de um mapa com os lugares onde ele esteve ou viveu em diferentes momentos. O hotel onde morou - que hoje exibe seu rosto em bronze na porta, com orgulho -, os cafés que frequentava, os cinemas, os lugares preferidos e até as pontes pelas quais gostava de cruzar o Sena. Seguir os passos de García Márquez em Paris foi a maneira que escolhi para viver essa cidade mítica para tantos autores latinoamericanos.


Foto do Socorro Acioli

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