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Parentela Sideral
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Professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, é especialista nas áreas de História da Arquitetura e do Urbanismo, Teoria de Arquitetura e Urbanismo, Projeto de Arquitetura e Urbanismo e Patrimônio Cultural Edificado. Escreve para o Vida & Arte desde 2012.

Parentela Sideral

Como as coisas aqui na Terra vão de mal a pior, especialmente aqui no Bananão, voltemos nossos olhos aos céus. Foi o que fez um grupo de astrônomos da Nasa ao descobrir a apenas 40 anos-luz daqui, 380 trilhões de quilômetros, ou seja, “bem ali” no idioma estelar, na órbita da estrela-anã Trappist-1, um grupo de sete planetas bastante parecidos com este em que vivemos. Mais ou menos do tamanho desta nossa nave-mãe, os componentes deste sistema planetário, ou exoplanetas, como os chamam os cientistas, representam o máximo que se conseguiu até agora, em termos de pesquisa científica, para descobrir a presença de vida além do Sistema Solar. Aquelas velhas perguntas poderão agora ser respondidas: “Estamos sós no Universo ou temos companhia? Se temos, torcerão Ceará, Fortaleza ou Ferrim?”.

Os pesquisadores mostram-se animados com os nossos primos siderais. Rochosos, três deles dão pinta de terem oceanos de água líquida. A proximidade com a nossa morada e a penumbra do seu frio sol vermelho dão condições a combinações químicas que podem viabilizar uma eventual atividade biológica. Fico a imaginar como seria o tipo desses extraterrestres. Seriam feios e sinistros como esses carecas e outras figuras dantescas (Lobão, por exemplo) que abundam no governo interino? Como dizia o Manezinho do Bispo, este certamente um ser de outro planeta que caiu nos braços desta Loura em meados do século XIX, uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Os modelitos terráqueos não estão com nada. Terão luas, esses corpos celestes? Terão estações, ventos e marés? Terão chuva e neblina?

Admiro gente que trabalha se divertindo e vice-versa. A turma boa da agência espacial norte-americana, verminosa quanto a lances interplanetários, chegou a passar 24 horas por dia de olho grudado na lente do telescópio Spitzer para dar conta dos sete danadinhos. Coitados, sabem calcular as trajetórias e as posições dos astros no espaço infinito a cada segundo, mas talvez nem atinem onde se encontram e o que estão fazendo, neste momento, suas esposas, maridos e filhos. A escala do objeto do seu ofício é simplesmente acachapante. Quem, quando criança, não sonhou ser alguém assim? Explorar galáxias, Via Láctea, Andrômeda, Pequena Nuvem, Grande Nuvem, Catavento do Sul. Quantas vezes não me enfiei debaixo da cama e me imaginei num foguete, viajando nos rastros de fogo e poeira dos cometas e asteróides...

Ah, quantos mistérios guarda o firmamento, essa abóbada estrelada que é apenas passado. A mecânica dos astros, a sinfonia das esferas, tudo regido por um metrônomo superior. Essa ordem, essa matemática, essa precisão, é a isso que chamamos Deus? Súbito, no ônibus, sou rudemente apartado dessas minhas elucubrações metafísico-galáticas pela mulher desorientada que era para ter descido no Coração de Jesus e agora está mais ariada do que cachorro caído de mudança. Em seu posto, o trocador raquítico, de cabeça triangular e olhos esbugalhados, na certa um alienígena de passagem pelo nosso mundo com a missão de reconhecimento da raça humana, em um átimo desenhou todo o trajeto que a pobre infeliz deveria cumprir para chegar ao seu destino. “Obrigada, moço”, disse ela. “Znorkshw”, grunhiu ele, sério.
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