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Pesquisa vai reorientar discurso do PT

2017-04-08 17:00:00
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Há duas maneiras de ler a pesquisa da Fundação Perseu Abramo (ligado ao Partido dos Trabalhadores), que está provocando frisson nas redes sociais e em alguns críticos do PT. 1) Fazer como o jornal O Estado de S. Paulo que, em editorial (3/4/2017), aproveitou para dar mais um chute na canela do PT, cravando o título “Colapso do discurso petista” - afirmando que “toda a discussão sobre a divisão da sociedade entre ‘nós’ e ‘eles’, promovida incessantemente pelo PT, é significativa somente para as classes médias e as suas redes sociais”. 2) Tentar entender o fenômeno revelado no estudo, mais complexo do que faz crer a rasa conclusão do jornal paulista.
 

Antes, é preciso lembrar que Lula, no governo, foi um exemplo de conciliação de classes, agradando aos dois extremos da pirâmide social brasileira. Os mais pobres, com programas de complementação de renda - e os mais ricos oferecendo-lhes empréstimos de bancos estatais e outras facilidades. O próprio Lula costumava jactar-se de que empresários e banqueiros nunca haviam ganhado tanto dinheiro como no governo dele.

Tendo sido ele um pai dos pobres e mãe dos ricos, ficou chateado com a oposição virulenta desses setores privilegiados contra a sua protegida, Dilma Rousseff. Creio que foi aí que resolveu tirar do baú o lema de uma de suas primeiras campanhas - “trabalhador vota em trabalhador” - e reciclá-la. 

 

Assim, o discurso do “nós contra eles” foi turbinado nas redes sociais servindo de contraponto à insana campanha que levou ao golpe contra Dilma.
 

Não que isso desculpe os doidinhos digitais de ambos os lados do espectro ideológico, porém analisar a pesquisa somente por esse ângulo resvala na indigência intelectual. A mais, a Fundação Perseu Abramo (FPA) optou por divulgar o estudo submetendo-o ao escrutínio e ao debate públicos, coragem que certamente faltaria a muitos “acadêmicos” do circuito de palestras e a algumas organizações que se supõem acima de qualquer crítica.

Pois bem, a FPA resolveu fazer uma pesquisa na periferia de São Paulo para entender o comportamento de eleitores que votaram em Lula de 2000 a 2012, mas não votaram em Dilma na eleição presidencial de 2014 e nem em Fernando Haddad nas eleições municipais de 2016 (perdeu a eleição para João Doria no primeiro turno). Os pesquisados foram divididos em duas faixas de renda: até dois salários mínimos e mais de dois até cinco salários mínimos.
Dois dos resultados da consulta, que o jornal paulista entendeu como “colapso” do discurso petista. 1) “No imaginário da população não há luta de classes; o ‘inimigo’ é, em grande medida, o próprio Estado ineficaz e incompetente, abre-se espaço para o ‘liberalismo popular’ com demanda de menos Estado” (anotado pela própria FPA na conclusão de seu estudo). 2) Revelou-se que os pesquisados valorizam o mérito pessoal; por isso, admiram pessoas díspares como Lula e João Doria (prefeito de São Paulo), que teriam ascendido socialmente por esforço próprio.
 

Porém a pesquisa é mais complexa. Ao tempo, por exemplo, que rejeitam as cotas, pois parecem “duvidar” da capacidade pessoal, os consultados entendem como importante o programa Bolsa Família.
 

Uma coisa que deveria levar a pensar: independentemente da renda, a tendência dos pesquisados foi de se autoclassificarem como de “classe média”, mirando as pessoas que estão em degraus acima deles. E, vejam, a classe média também se orienta pelos valores dos mais ricos do que ela. Se o discurso marxista não tivesse entrado em colapso, ousaria dizer que é o “aparelho ideológico” da burguesia em funcionamento.

Nova classe média
A pesquisa foi feita na periferia de São Paulo, mas creio que dá uma boa ideia do que pensa essa nova classe trabalhadora de modo geral. E levando-se em conta a vontade de quem a compõe, pode ser chamada de “nova classe média”, denominação da qual alguns teóricos discordam.

Não é pelos 20 centavos
As jornadas de junho de 2013 adiantaram algumas percepções comprovadas pela pesquisa da Fundação Perseu Abramo. A inserção no mercado de trabalho e o aumento de renda levaram a novas aspirações. E a “nova classe média”, já experimentada na batalha pela sobrevivência, viu a sua ascensão unicamente como resultado de seu próprio esforço.

Crédito
O estudo é bastante rico em dados e análises: tem 67 páginas, mas a leitura é descomplicada. A pesquisa pode ser vista aqui (https://goo.gl/fyW16Y). A página da Fundação Perseu Abramo publica também alguns artigos sobre
o assunto.  

 

Por Plínio Bortolloti

Adriano Nogueira

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