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Corrupção e violência
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Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros

Corrupção e violência


Dois atributos primitivos do humano chegam ao topo da estrutura de valores que comanda parte significativa das instituições públicas e privadas brasileiras. Ser corrupto e violento ganhou posição de destaque em uma sociedade refém da sua própria fragilidade de expectativas. O mais grave dessa situação é quando o senso comum começa a admitir ou até a admirar quem se dá bem a qualquer custo.


A corrupção e a violência estão presentes em toda a história da humanidade, entretanto, o refinamento da vida em sociedade criou mecanismos de inibição desses dois traços maléficos, a fim de que eles não se sobressaiam. As leis, por exemplo, são mecanismos reguladores desse tipo de prática antissocial. Mas em momentos que corruptos e violentos tomam o poder, as leis são alteradas em seu favor.


O Estado, criado dentre outras coisas para ter o monopólio da violência, e, com isso, o recurso do estabelecimento da ordem social e do controle do crime, ao assumir também a corrupção como parte de si, torna-se o principal cúmplice do fortalecimento do mercado da segurança. Com isso, a sábia divisão feita entre sociedade civil e militar, que distingue democracia e hierarquia, entra em processo de inversão, enfraquecendo a cidadania.


Vive-se um dilema altamente complexo como efeito da coalizão entre corruptos e violentos. De um lado, o Estado abre mão da sua responsabilidade exclusiva de provedor de segurança, e, nesse vácuo, proliferam os negócios orientados ou dirigidos por profissionais militares e delegados; do outro lado, exacerbam-se as denúncias impulsionadas por ressentimentos associados a causas, em um sensacionalismo de fascinação e paranoia.


O mais crítico nessas premissas é que ambas são propagadoras de medo. Em uma, o medo é causado pela consciência do perigo existente na confusão feita entre polícia, bandido e empresário de segurança; na outra, o medo nasce do temor de linchamento moral quando alguém ousa dizer algo que possa ir de encontro ao caráter intocável de certas denúncias, que, almejando a punições, muitas vezes alimentam o sistema de insegurança.


Se uma e outra propagam o medo, as duas assumem o jogo no campo e com as regras dos corruptos e violentos. Estabelece-se, assim, a negação ao debate sobre as variáveis das motivações, deixando-se o terreno livre para a consolidação do delito como produto e da delinquência como status social. Inclusive, a educação quando voltada essencialmente para a competitividade, prepara potenciais corruptos e violentos.


No Brasil, o esforço dos que extraviaram a identidade da esquerda para caracterizar desvios éticos como prerrogativa do poder presta um desserviço ao País, à medida em que contamina a sociedade com um estranho fertilizante que aumenta a produtividade das ervas daninhas. A retórica da vitimização está permeada de reações agressivas e entra em choque com a falta de modos dos que tomaram o poder, numa viralizante guerra civil digital.


Qualquer mudança a ser feita no percurso da crise atual passa pela negação à corrupção e à violência. E aqui não interessa se o implicado é partidário, amigo, parente ou adversário. Precisamos aprender a lidar com as frustrações que essas situações nos trazem. Estamos no impasse de um mundo intervalar e é preciso coragem para sonhar de novo.


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