PUBLICIDADE
VERSÃO IMPRESSA

O roteiro jamais escrito

2017-03-09 01:30:00

A queda do PIB 2016 confirma o que já se sabia. A recessão de 2016 (-3,6%) gera uma retração acumulada de 7,2% em apenas dois anos. Índice negativo histórico. É bem maior que o acúmulo de dois anos de queda da atividade econômica da “grande recessão” de 1930, quando a economia mundial entrou em profundo declínio. Na época, a economia brasileira era apenas agrária, com uma população majoritariamente rural.


O índice de 2016 é a consequência de uma catástrofe construída com método. Uma tragédia só nossa. Tudo aconteceu sem a ajuda externa. Os efeitos foram desastrosos para as vidas de milhões de pessoas. Empobrecimento, desemprego, quebras de empresas, endividamento dos cidadãos e queda na capacidade de consumo das famílias.


O resultado hoje exposto é de 2016. Na economia, a incompetência e os erros de uma fase se refletem meses e até anos depois. Da mesma forma, os acertos apresentam seus resultados muito depois, numa proporção ainda mais lenta. Reverter os índices econômicos, que possui uma lógica complexa, é um processo lento e gradual.

[QUOTE1]

Felizmente, há alguns sinais de que a recessão pode ter chegado ao fim. No entanto, são muitas as incertezas pela frente, incluindo as variáveis de cunho político. Saberemos com alguma certeza se começou um ciclo promissor apenas quando sair o resultado do PIB do primeiro trimestre de 2017. Porém, o rastro da tragédia econômica, com efeitos dramáticos sociais, ainda vai perdurar por muito tempo.


Quando os erros sistemáticos na política econômica são analisados em conjunto com a teia de corrupção que foi estruturada no País, a coisa toda ganha uma dimensão ainda mais assustadora. A corrupção se estabeleceu como um método para sustentar o projeto de poder e, de quebra, enriquecer uns e outros.


Tudo chegou a um grau tal de sofisticação tão mafiosa que a Odebrecht mantinha um departamento para organizar as planilhas da propina. Coisa nunca antes vista nesse País. O tamanho financeiro do absurdo não tem parâmetro no mundo. Somente essa empresa avalia que mais de 3,39 bilhões de dólares passaram pelo seu departamento da propina no período entre 2006 e 2014. No câmbio de hoje, mais de 10 bilhões de reais.


Chegou-se ao rigor de desmoralizar até as doações legais. Era assim: as empresas “doavam” legalmente para as campanhas indicadas pelos chefes do Governo, os valores eram registrados por partidos e candidatos, mas a grana era fruto de propina. Ou seja, a Justiça Eleitoral virou uma máquina de lavar dinheiro de superfaturamentos em obras públicas.


João Santana, o marqueteiro mor, o homem com entrada livre no gabinete presidencial, que dava a palavra final em todas as falas públicas de Dilma Rousseff, recebeu somente da Odebrecht mais de 14 milhões de dólares. Tudo em dinheiro vivo e somente em 2014, ano da reeleição de Dilma. Santana está preso, virou um delator e tende a confirmar a contabilidade.


A propina também servia para bancar o apoio de partidos às campanhas presidenciais. Alexandrino Alencar, ex-diretor da Odebrecht, declarou que a tesouraria da campanha de Dilma em 2014 recebeu R$ 30 milhões “por fora” para pagar os partidos agregados na coligação “Com a Força do Povo”. Sim, com a força do nosso dinheiro.


É um roteiro inacreditável.

 

Adriano Nogueira

TAGS