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Cidade dos rios

17:00 | 28/01/2017

Achei honesta uma conversa que tive com Aníbal Gaviria Correa, ex-prefeito de Medellín e ex-governador de Antioquia. Quando me disse sobre o arrependimento que teve de ter pelos rios que cortam a cidade onde foi alcaide.


Relação amorosa que havia com as águas, mas que se perdeu enquanto a cidade cresceu desordenada. Concreto, asfalto, tubos nos córregos, riachos, veios e lagoas de Medellín.


Ora, talvez não exista um lugar no mundo que em algum caminho não passe um rio na porta, na saudade ou no remorso de ter tido um por perto. Gaviria teve de pedir perdão aos rios e ressuscitá-los.


Aníbal Gaviria é aquele morador da “Casa Comum” que recolocou Medellín nas manchetes do planeta por priorizar a “vida” na cidade onde nasceu há 51 anos e ainda hoje a experimenta.


Medellín, pedaço montanhoso da América do Sul, deixou de ser notícia pela insistência da produção de “mortos” em escala violenta. Resultado do embrenhado entre narcotráfico, pobreza e as Farcs.

 

Lá, a violência e o homicídio deixaram de ser imposição apenas nas portas e nas ruas dos segregados da cidade e passaram a se aboletar, sem cerimônia, na parte soberba do burgo.


Meio que parecido com a guerra miserável daqui, onde Aldeota passou a ter crise de nervos e se surpreender, apavorada pelas Redes, com a barbárie que agora arromba a porta. Se fosse só para aperreá-la... mas veio para matar.


Gaviria teve um irmão, o governador Guillermo Gaviria (Antioquia), assassinado aos 40 anos (2003) pelas Farcs. Teve a mãe sequestrada...


Mais isso foi outra conversa sobre a morte que caiu de 429 homicídios para cada 100 mil colombianos, em Medellín, para 19.


O ex-prefeito resolveu que em Medellín a vida ia voltar a ser mais importante que a morte. Em mil e um novos olhares e, entre eles, o reencontro das pessoas com os rios no lugar público.

 

Detonado, poluído, assoreado, esgotado, defecado, cuspido, fedido, afogado... o rio Medellín, atravessador de 16 km do miolo da cidade, foi resgatado da experiência de quase finamento.


Saiu de um coma, quase sem volta, graças ao projeto Parques del Río. Ressurgência e dignidade. E deu à cidade mais uma chance de sair da sintonia do fenecimento com o reuso do espaço urbano.


Lendo e ouvindo quem vive Medellín parece, de verdade, haver menos bafafá e governança honesta.


Haviam destruído as águas, os bichos da mata ciliar, os peixes, o cheiro... a possibilidade de molhar os pés, de bebê-lo... os pássaros, a alma do rio. Disse-me, mais ou menos assim.


Fiquei invejando pelo Cocó, o Ceará, o Pacoti, o Maranguapinho... Pajeú, Maceió, Jacarecanga, a lagoa da Parangaba, Maraponga, Papicu, Porangabuçu, Janguruçu, o riacho Aguanambi...


Fui apresentado a Gaviria, gentilmente, pelo prefeito Roberto Cláudio e a secretária Patrícia Macedo. No seminário Internacional de Políticas Públicas Inovadoras para as Cidades. Bom que também estavam lá o governador Camilo e o secretário Artur Bruno.


Que renasçamos rios! Pelo bem de quem nunca viveu um. Os que ainda correm (ruinzinhos) ou passaram no lugar daquela rua asfaltada ou cheia de árvores faltando...


DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO demitri@opovo.com.br


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